segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Moon of Alabama - Não. O que 'funcionou' não foram as 'sanções' contra o Irã!

18/1/2016, Moon of Alabama


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu






Alguns mais (ou menos) espertos creem que a implementação do acordo nuclear iraniano mostraria que "sanções funcionaram":

Doug Saunders @DougSaunders
Paradoxo iraniano: essa semana provou q sanções funcionaram. Pior semana para os EUA imporem novas sanções 
10:42 AM - 17 Jan 2016

Nada mais completamente errado. Sanções não funcionaram no caso da questão nuclear com o Irã. E também não funcionarão no caso do programa de mísseis balísticos do Irã.

Outros autores já discorreram longamente sobre isso, mas é preciso repetir.


Para o Irã, desenvolver programa nuclear civil para eletricidade e outras necessidades era e é visto como precondição para ser estado moderno plenamente desenvolvido. 

EUA e Israel queriam impedir que acontecesse. Israel vê o Irã como potência concorrente no Oriente Médio, e os EUA veem o Irã independente demais e poderoso demais para ser deixado solto. Os dois governos querem limitar o crescimento do Irã, a menos que o Irã aceite converter-se no velho estado-cliente que era antes.

O pretexto para pressionar o Irã foi seu programa nuclear e uma ideia fixa dos EUA, segundo a qual "o Irã não tem direito de enriquecer" urânio. A ideia fixa sempre foi errada como argumento suposto legal, porque todos os estados têm direito natural de usar os próprios recursos como bem entendam, mas os EUA esforçaram-se tresloucadamente para 'provar' a validade e a legitimidade (inexistentes) daquela sua ideia fixa. Se tivessem conseguido, teriam conseguido vetar o modo como o Irã, e todos os demais países do mundo, administram os próprios recursos.

Foi a ideia fixa dos EUA e o empenho com que o Irã resistiu e defendeu-se, que prolongaram o conflito por mais de uma década. Depois das primeiras 'denúncias' (falsas) de que o Irã estaria desenvolvendo armas atômicas, começaram as negociações e o avanço foi rápido. O Irã está disposto a restringir suas atividades e permitir que seu programa nuclear passe por completa inspeção. 

Mas foi a obsessão dos EUA com "nenhum direito de enriquecer urânio" que bloqueou por tanto tempo qualquer solução. Peter Jenkins, negociador do Reino Unido, escreveu:
Tendo servido na equipe de negociadores britânicos nas negociações com o Irã em 2004 e 2005, sei que em março de 2005 o presidente Hassan Rouhani e o ministro Javad Zarif, então em diferentes funções, estavam prontos a oferecer acordo muito semelhante, no essencial, ao JCPOA [Joint Comprehensive Plan of Action, "Plano de Ação Conjunto Amplo" nome pomposo de um acordo que 'sabe' que não pode nem proibir nem impor, mas mesmo assim impõe e proíbe (NTs)].
Naquele momento, o Irã tinha apenas algumas poucas centrífugas experimentais e pouco urânio enriquecido.

Mas os EUA insistiram, obcecados, que o Irã não teria direito de enriquecer urânio e detonaram as negociações. Vieram as sanções, e o Irã respondeu, aumentando suas capacidades para enriquecer urânio [direito que o Irã tem, tinha e sempre teve (NTs)]. Seguiram-se mais rodadas de sanções, e a cada uma delas o Irã respondeu, sempre, com aumento de suas próprias capacidades. Depois da última rodada de sanções, o Irã anunciou que criaria urânio altamente enriquecido para usar como combustível de submarinos nucleares.

Foi quando os EUA finalmente se deram contra de que era sem sentido e impossível aumentar infinitamente sanções internacionais, como meio para deter o programa nuclear iraniano. Restavam duas possibilidades. Ataque militar muito agressivo e muito caro contra o Irã, seguido de longa ocupação para a qual a opinião pública norte-americana tinha apetite zero; ou negociações para acertar a coisa.

Uma nova rodada de negociações começou em novembro de 2013. No centro dela lá estava outra vez o direito do Irã de enriquecer urânio:
Desacordo sobre se o Irã tinha ou não tinha, nos termos da lei internacional, o direito de enriquecer urânio está no centro da disputa que se arrasta por uma década, sobre o programa nuclear iraniano e tem dificultado todo o trabalha diplomático para pôr fim ao impasse. 
Funcionários iranianos deixaram claro logo no terceiro dia de conversações em Genebra, na 6ª-feira, que o 'direito' do Estado Islâmico para enriquecer urânio estava sendo imposto como parte de um acordo intermediário, cujo objetivo era pôr fim à atividade atômica do país, em troca de algum alívio nas 'sanções'. 
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Os EUA dizem que nenhum país tem esse direito explícito, nos termos do Acordo de Não Proliferação, o pacto global de 1970 concebido para impedir a disseminação de arsenais atômicos.
Durante aquelas negociações em 2013, os EUA finalmente cederam, e uns dias depois chegaram a um acordo preliminar:

O acordo nuclear inicial firmado com o Irã no fim de semana afirma, sem ambiguidades, que o segundo passo – ou "solução ampla" – terá de "envolver programa mutuamente definido para enriquecimento, com limites práticos." 
Os termos adotados permitem a Teerã declarar que os EUA e cinco outras potências nas negociações concederam que um acordo final, a ser assinado nos próximos seis meses, deixará o Irã com o seu programa doméstico de enriquecimento de urânio.

O Irã interpretou tudo isso como o reconhecimento de seu direito a manter um programa de enriquecimento de urânio. Depois de decidida essa questão chave, as demais negociações foram pontos de toma-lá-dá-cá, mas já não havia qualquer desacordo fundamental.

Como só se soube mais tarde, os EUA haviam cedido na questão de "enriquecimento zero", já antes das negociações de novembro 2013:
O canal secreto de diplomacia EUA-Irã que ajudou a promover o acordo intermediário do ano passado foi acionado, e uma mensagem do presidente Obama chegou ao Irã: Os EUA estavam preparados para aceitar um programa iraniano limitado de enriquecimento doméstico como parte do acordo nuclear pelo qual o Irã daria passos concretos e verificáveis para garantir ao mundo que seu programa nuclear permaneceria pacífico. 
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A mensagem de Obama, de que estaria preparado para aceitar programa iraniano de enriquecimento limitado em acordo que, assim, seria aceitável, foi passada ao Irã em reunião secreta em Omã, em março de 2013, por delegação dos EUA liderada pelo vice-secretário de Estado Bill Burns, e que incluía Jake Sullivan, hoje conselheiro para segurança nacional do vice-presidente Joe Biden, Einhorn e o então conselheiro da Casa Branca para assuntos do Irã Puneet Talwar.
CONCLUSÃO: Foram os EUA que cederam e abandonaram a posição (indefensável) de que o Irã 'não poderia' enriquecer urânio. E foi a evidência de que os EUA haviam cedido e mudado de opinião – não alguma 'sanção' – que levou o Irã novamente à mesa de negociações, e permitiu pôr fim ao conflito sobre o programa nuclear iraniano.*****